Bissexualidade, o sexo do futuro?

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24/04/2013

 

        O depoimento emocionante da cantora Daniela Mercury assumindo uma relação de amor com uma mulher, a jornalista Malu Verçosa, no programa Fantástico da rede Globo demonstra a coragem de uma pessoa forte que legitima seu amor pela nova companheira e assume sua felicidade afirmando-se como ser livre e assumindo ao país sua orientação sexual, mas acima de tudo, o amor como propósito da expressão de liberdade e autonomia. Daniela defendeu a igualdade e um posicionamento verdadeiro sobre seus sentimentos.


         Desde que a cantora assumiu seu relacionamento com uma mulher, críticas foram feitas, questionando-a sobre o fato de ter sido casada com Marco Scabia. O ex-marido já se pronunciou e declarou torcer e apoiar Daniela neste novo momento em sua vida, demonstrando não se incomodar com a sexualidade da ex-mulher. O desejo bissexual da cantora ainda é visto com resistência e preconceito pela sociedade. O ator José de Abreu, recentemente declarou em sua página do twitter: “Eu sou bissexual e daí? Posso escolher quem eu beijo? Quando quero beijar uma pessoa não peço atestado de preferência sexual, só depende dela querer.” E teoriza: “tem dias que prefiro homens, tem dias que prefiro mulheres. Tenho que mudar? Eu sou assim, ué. Tenho que ser igual aos outros? Prefiro o que me dá prazer. E prefiro ter a ‘preferência’ que deixa-la nas mãos da natureza… Ou de Deus. Prefiro homens e mulheres que me interessem sexualmente”. As declarações defendem os homossexuais e confronta opiniões de políticos e o conservadorismo de religiosos.


         O bissexual muitas vezes é acusado de ser alguém com dúvida e de estar passando por um momento de transição até confirmar sua homossexualidade. A bissexualidade existe sim e é preciso reconhecer esta orientação sexual. O desejo e a atração sexual são direcionados igualmente para homens e mulheres. A identidade sexual é bem definida e não admite estereótipos, ou seja, não é porque uma mulher está se relacionando com uma mulher que ela seja, necessariamente, homossexual. O bissexual não é um homossexual enrustido, mas uma pessoa que transita livremente no sistema binário, homem ou mulher.


         Desde cedo somos exigidos a se relacionar com alguém do sexo oposto, portanto, enquadrar-se numa heterossexualidade. Esta imposição denuncia que a heterossexualidade é compulsória, assim como afirma Richard Miskolci, professor do departamento de Sociologia da UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos), “todos têm essa possibilidade de se relacionar com o mesmo sexo, mas, no processo de socialização, as pessoas podem perdê-la. Desde crianças somos adestrados. Heterossexualidade não é algo natural, hoje sabemos que ela e compulsória”, declara o professor.


         Existe um número grande de pessoas que apresentam este desejo dualista e resultado disso são sites de encontros que propiciam a relação bissexual. Homens que estão namorando com mulheres e se cadastram buscando relacionamentos com homens. Muitos equívocos são atribuídos à bissexualidade, que é uma expressão legítima do desejo. Acusados de promíscuos, de não conseguirem ter uma relação monogâmica, os bissexuais podem ter relações duradouras e fidelizadas. Promiscuidade é ter relações sexuais sem limites ou critérios. É banalizar as relações amorosas e sexuais sem criar vínculos e considerar as pessoas como um objeto de realização de prazer, em que se dá mais valor à quantidade do que a qualidade. O bissexual pode sentir-se atraído por ambos os sexos, mesmo que não coleque isso em prática. “Há promíscuos e não promíscuos heterossexuais, bissexuais e homossexuais. O indivíduo que realiza sua bissexualidade não pode ser considerado promíscuo por esse comportamento exclusivamente”, declara a psiquiatra Carmita Abdo, fundadora e coordenadora do ProSex (Programa de Estudos em Sexualidade da USP). 


         A igualdade entre homens e mulheres cria intersecções cada vez maiores entre masculino e feminino. As diferenças são destituídas a partir de um processo mútuo de identificação. Com a inserção das mulheres no mercado de trabalho, o advento da pílula anticoncepcional, a liberdade sexual e o movimento hippie, a bissexualidade é revelada. Na década de 50, Alfred Kinsey, estudioso sobre sexualidade, criou uma escala que ia de 0 a 6, em que 0 era “exclusivamente heterossexual” e 6 “exclusivamente homossexual”. No meio da tabela, o 3 representa “bissexual”.  Segundo essa escala, 46% dos entrevistados eram exclusivamente heterossexuais, 4% exclusivamente homossexuais e 50% não se apresentavam exclusivamente nem homo e nem heterossexuais, mas bissexuais.


         Freud concebia uma “bissexualidade psíquica inata”, algo possível para o ser humano tendo como base o desenvolvimento sexual das crianças, que interiorizavam como referência os órgãos sexuais do pai e da mãe. Segundo Jung, o ser humano possui uma bissexualidade psíquica herdada pelas experiências raciais do homem com a mulher e da mulher com o homem. Os conceitos de “Anima” (arquétipo feminino no homem) e “Animus” (arquétipo masculino na mulher) são assim concebidos pelo teórico. Em outras palavras, vivendo com mulheres através do tempo o homem adquiriu características femininas e vivendo com homem a mulher tornou-se masculinizada. Em sua psique, o ser humano é bissexual.


         A identidade de gênero, masculino ou feminino, pode ser definido pela sociedade, mas o desejo e o prazer é mutável e alterável, logo, com o passar do tempo a orientação sexual pode mudar. Além dos papéis sociais ficarem cada vez mais estreitos, hoje, não existe mais a obrigação de manter as normas sociais que determinam os aspectos sexuais. A bissexualidade parece ser, definitivamente, uma realidade para todos.


* Breno Rosostolato é psicólogo e professor da Faculdade Santa Marcelina – FASM

 

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